quarta-feira, 8 de junho de 2016

A BUSCA do amado - "vistes o amado de minha alma?"

Amar significa dizer-se prontos para viver o aprendizado quotidiano da busca. A dinâmica da busca atesta que ninguém se basta a si mesmo, exige encaminhar-se para um êxodo profundo de si mesmo, atraído por aquela "terra sagrada que é o outro", para fundir-se na comunhão. O outro, porém, é mistério, está sempre além dos nossos desejos e das nossas expectativas, não é previsível, não requer posso, mas cuidado, proteção, é espaço de florescimento para a sua liberdade. Se isto vale para a criatura humana, quanto mais para Deus, mistério de suma liberdade, de relação dinâmica de
plenitude cuja grandeza nos supera, e cuja fragilidade manifestada por meio da cruz nos desarma.
O amor do Cântico dos Cânticos é luta e fadiga, exatamente como a morte (Ct 8,6), não é idealizado, mas cantado na consciência das suas crises e das suas perdas. A busca comporta cansaço, pede para levantar-se e para colocar-se a caminho, requer assumir a obscuridade da "noite". A noite é ausência, separação ou daquele que o coração ama; e o quarto da esposa, de lugar de repouso e de sonhos, se muda em prisão e lugar de pesadelos e tormentos (cf Ct 3,1). A esposa, protagonista principal do drama, busca o amado, mas ele está ausente. É necessário buscá-lo sair "pelas ruas e pelas praças" (Ct 3,2). Desafiando os perigos da noite, devorada pelo desejo de reabraça-lo, a esposa põe a eterna pergunta: "acaso vistes, vós, o amado de minha alma?" (Ct 3,3). É a pergunta lançada no coração da noite, que suscita a alegria da recordação dele, renova a ferida de uma distância insustentável. A esposa está sem dormir.
distanciamento
A noite volta protagonista no capítulo 5 do Cântico: a jovem está no seu quarto, o seu amado bate e pede para entrar, mas ela demora e ele vai embora (Ct 5,2-6). Dinâmica de incompreensão entre os dois ou sonho que se muda em terrível pesadelo? O texto prossegue com uma nova busca que tem o sabor de grande prova, não apenas emotiva e afetiva, mas também física, porque a esposa enfrenta a noite sozinha vem atingida pelos guardas, ferida e privada do seu amado (Ct 5,7). O amor desafia a noite e os seus perigos, é maior do que todo medo: "No amor hão há medo. Ao contrário, o perfeito amor lança fora o medo" (1Jo 4,18).
A mulher na busca do esposo age por um conhecimento pessoal do seu sentir. Perscruta a sua intimidade e se descobre "doente de amor" (Ct 1,5; 5,8). Esta doença significa a "alteração" da própria condição, o fato de que em virtude do encontro com o amado se sente irreversivelmente marcada, "alterada", isto é, se torna, dedicada, consagrada ao outro que preenche de sentido os seus dias. Tal é a condição de qualquer um que ama verdadeiramente.
Somente quem supera o labor da noite com o nome do amado nos lábios e o seu rosto impresso no coração, certo do vínculo que o une, pode saborear a refrescante alegria do encontro. O fogo do amor põe em relação de fusão os dois enamorados que, unidos pelo inverno da solidão, saboreiam a primavera da comunhão competindo mutuamente para celebrar com paixão e poesia a beleza do outro.
Contemplai, aos consagrados e às consagradas sobre os sinais da beleza, n.8

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